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Docência Pesquisa com Crianças em Contexto de Educação Bilíngue

Toda experiência nasce de uma zona de desenvolvimento potencial... antes de apresentar o que e como faço hoje, gostaria de sintetizar o contexto em que tudo floresceu. Sou graduada em pedagogia e tenho proficiência na língua inglesa, o que me possibilitou desde cedo trabalhar na educação infantil bilíngue, - sempre tive foco, mas não sabia o que era pesquisa. De certa forma buscava colocar em prática conceitos de uma pedagogia ativa, mas nunca de forma consciente e sintetizada, era apenas uma prática de resistência ao ensino fragmentado, dado pelo ímpeto revolucionário.

Até o dia que cruzei com o Paulo Fochi e tive a oportunidade de explanar sobre minha prática, porém quando fui questionada sobre o embasamento teórico da minha relação com as crianças, para que não se tratasse de um amontoado de senso comum e possibilitasse a outros professores exercer essa prática, faltou conceitos para explicar, não era práxis ainda. Como um bom professor, que não teme ser refém da didática, ele me explicou a necessidade da pesquisa, da teoria, da contextualização, pois sem isso minha prática não era pedagógica. Com o conselho, ou provocação de Fochi, eu atravessei a zona de desenvolvimento proximal e alcancei a zona de desenvolvimento real. Descobri que para o processo pedagógico ser contínuo e reciproco, levando o professor a assimilar e colocar em prática teorias de forma contextualizada, declarando a dualidade entre docência e pesquisa, é preciso primeiramente ter foco, não se pode investigar tudo ao mesmo tempo. Então fiz uma escolha e foi nesse momento que comecei a me “aventumaravilhar”, - salve Rodari e os binômios fantásticos, - com a docência-pesquisa com crianças em contexto de educação infantil bilíngue com enfoque comunicativo.

Esse trajeto começou dentro do chão da escola como professora de projetos bilíngue e inglês, quando busquei maneiras de colocar em prática de forma intencional conceitos que repetidamente eram explorados nos diversos cursos e formações que frequentava, após essa conscientização da prática, busquei em meu artigo de pós-graduação: O Professor de Educação Infantil Bilíngue: um ateleierista de linguagem, sintetizar os princípios e teorias que funcionavam para meu contexto educativo e sintetizavam uma didática para a educação infantil bilíngue.

Um recurso importante nesse percurso investigativo, foi o registro gráfico e por vídeos das situações de aprendizagem e do cotidiano, que em ciclos eram revisitados para análise. Nesse percurso didático-avaliativo comecei a perceber que mesmo em diferentes espaços educativos, em determinados contextos, comportamentos e estratégias relacionadas a mobilização da língua estrangeira se repetiam em determinadas fases, evidenciando o processo de evolução e aquisição da língua estrangeira, eu estava aprendendo sobre como as crianças aprendem. Era o nascer da minha práxis e do desejo de uma pesquisa que pudesse ser aprofundada.

Iniciei um projeto de assessoria pedagógica para crianças bilíngues, no qual acontecem encontros semanais com duração de 1 hora a 2 horas, em que apresento diferentes provocações por imagem em um tablet e a criança escolhe do que iremos brincar, quanto tempo, como conduzir a brincadeira e a mediação do encontro é feita em inglês, sem que a criança tenha a obrigatoriedade de repetir algo, somos dois sujeitos buscando estratégias para se comunicar e se relacionar pelo brincar, a língua estrangeira é o meio e não o produto final. Nesses encontros documento em vídeos a mobilização autônoma da língua estrangeira pela criança, esses vídeos são tratados e se transformam em mini histórias que evidenciam o potencial comunicativo das crianças, através do brincar, esses registros são verdadeiras documentações pedagógicas enfatizando uma visão de sujeito comunicativo e potente das crianças em contextos bilíngues na primeira infância, revelando uma possibilidade para a relação entre adultos e crianças bilíngues.

A cada vídeo realizo uma análise do que possivelmente levou a criança a determinados processos, o que esses processos indicam para nós educadores e o que podemos fazer com essa descoberta, tanto por nós, como pela criança. É como se cada documentação pedagógica, ao mesmo tempo que evidencia as estratégias de linguagem das crianças, me permite como professores compreender sobre o desenvolvimento infantil e da língua estrangeira na infância. Um processo que se retroalimenta, um processo meta, um processo didático.

O ato de documentar e revisitar esses registros é uma investigação, são livros abertos, busca por antigas anotações, reabertura de artigos já lidos, novas leituras e conversas com colegas. É o contraste do que foi dito com o que eu acredito e vivencio, é diálogo... é perceber que nós seres humanos ao mesmo tempo que somos subjetivos, seguimos uma certa linearidade, ou será que correspondemos a certos processos inatos? São perguntas e respostas que levam a outras perguntas, porque estra em processo de formação é isso, seguir na busca de algo... isso possibilita que minha pesquisa prossiga, a busca por respostas que incitem novas perguntas e não a busca por receitas.

Para que eu pudesse ter um olhar mais crítico e sensível, precisei sair da zona de conforto, precisei dar continuidade aos estudos, para ampliar meu fardo teórico, para além daquele pouco que me entregaram na graduação, me aventurar na vida acadêmica, investir muito em livros, cursos e eventos que promovessem diálogos para construir minhas próprias perguntas, esse caminhos foi essencial para que eu pudesse desenvolver minhas concepções sobre a experiência compartilhada com as crianças, embasada no entrelaço de contribuições teóricas de diferentes áreas como a pedagogia, psicologia, filosofia e linguística. É como se aventurar no arcabouço da história da pedagogia e saberes instrumentais. De forma alguma eu estou inventando a roda, eu estou apenas explorando e atando os nós sobre o que já foi dito e passou batido no âmbito da educação infantil.


(Texto apresentado na roda de conversa sobre Docência e Pesquisa na Educação Infantil, com os mestres da educação Joe Garcia e Gabriel Junqueira Filho em Junho de 2020).

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